O ônibus


O ônibus não demorou muito. O motorista fala que está com problema. Seria do ônibus? Não. Ainda bem. Era da máquina da trocadora. Menos mau. Problema resolvido. E agora? Na dúvida entre esperar o da outra linha, ele acabou escolhendo entrar no que chegou primeiro, mas que sempre sai depois do que chega depois. Deu sorte. O que chegou primeiro saiu primeiro.

A trocadora está ao telefone. Dois homens estranhos entram. Um de boné e sandália senta-se no banco do meu lado. Outro, careca, de fone nos ouvidos, conversa com a trocadora e fica parado sem passar na roleta. Eu olho para ele, ele disfarça. Vem e senta-se atrás de mim. Eu já me preparo para levar um tiro pelas costas. Olho rapidamente para trás e vejo um vulto.

Seria ele o mesmo homem que estava no cinema horas atrás? Com a mulher de vestido branco curto? Também não consegui vê-lo. A mulher sim. Mas seus cabelos tapavam-lhe o rosto. Sei que era loira e tinha um corpo bonito. Será que o homem me perseguia porque eu olhei para a mulher dele? O certo é que ele estava atrás de mim. E alguma coisa eu teria de fazer.

Um policial entra no ônibus e senta no banco único da frente. Algum perigo pairava no ar. Mas eu podia me sentir mais seguro. Levanto e vou sentar lá atrás. A mulher, como uma mágica, não está mais ali. O homem também se levanta. Eu dou o sinal. Ele pergunta: “Vai descer aqui?”. Eu respondo: Não. No próximo. Ele insiste: “Nunca te vi por aqui”. Eu encerro a conversa: É né.

E desço do ônibus. Neste instante, uma outra mulher, morena, de dentro do ônibus, olha para trás como se me procurasse. A trocadora conversa com o policial, que atira. O homem também havia descido e apontava a arma para mim. Olhei para o policial e percebi que o conhecia. Era filho de um vizinho meu. Ele que me salvou. E agora eu seria eternamente grato a ele.

Mas, afinal, o que aquele homem careca teria contra mim? O ônibus que chegou e saiu depois, chegou primeiro. Talvez se eu não tivesse pego o ônibus errado. Melhor ainda. Talvez se eu não tivesse ido ao cinema naquele dia. Tudo porque estava sem o telefone celular. Tentaram me avisar, mas não conseguiram. O destino mudado pela falta de um celular. Como uma ligação pode mudar o seu destino.

Agora estava jurado. Quando encontraria com o rapaz careca de novo? Será que insistiria em me matar? Cheguei à casa. Minha filha não estava. Tinha saído com a minha mãe, avó dela. Minha mulher me diz que minha mãe havia acabado de me ligar preocupada, pois já era tarde e eu ainda não havia chegado. Agora era eu que estava preocupado com minha filha, pois já era tarde e ela ainda não havia chegado...

Wesley Machado

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