Percepções Delirantes


16 de maio de 2003. Primeira consulta ao psiquiatra. Está registrado no prontuário do Dr. Humberto Siqueira. Minha amiga Bernadete diz que eu sou bipolar. O remédio com o qual me adapto (Orap) é para psicose. A crise de abstinência de maconha provoca-me surtos. Num certo dia, indo para o trabalho, no ônibus tenho um desmaio. Ao chegar ao hospital Ferreira Machado retomo a consciência e vejo justamente meu amigo Leandro me retirando da ambulância e me colocando na maca. Aos poucos chega minha mãe, Ezilane; e minha esposa, Nilcea.

16 de maio de 2015. Exatamente 12 anos depois da minha primeira consulta ao psiquiatra, mudo-me para minha casa própria, construída com ajuda dos meus pais num terreno que comprei e paguei com ajuda da minha mãe. A sensação de estar no seu lar é indescritível. O ar de liberdade ao tomar um café na mesa da sua casa. Respirar fundo e sorrir levemente, cantar.

Uma terça-feira de maio de 2017. Meu cunhado Felipe liga para meu pai, Fernando. Estamos na casa do amigo, o médico Edson Batista. Uma lágrima cai dos olhos do meu pai, que fala:

- Eu não sirvo para essas coisas.

Meu pai sai do escritório dizendo que minha irmã, Fernanda, sofreu um acidente de carro.

Sem saber ao certo o que aconteceu, eu começo a me preocupar em ter acontecido o pior.

Teria minha irmã morrido? Ela estaria sozinha? E minha filha mais nova Júlia? Estava com ela?

A preocupação se transforma em um novo surto psicótico. E chego a conclusões ilusórias.

Minha irmã morreu e minha filha estava junto, se machucou muito e teria de ser operada.

Passo a perguntar constantemente a Dr. Edson o que aconteceu. Ele poderia saber.

Mas Dr. Edson me tranquiliza e diz que : “Está tudo bem. Não aconteceu nada”.

Eu não acredito. E insisto em perguntar a Dr. Edson se minha irmã tinha morrido. E quem estava com ela. Se não foi minha irmã que morreu, quem foi? Meu irmão, Weverthon, que naquele mesmo dia tinha viajado para a cidade do Rio de Janeiro? E Júlia? Estava no carro?

Outra terça-feira de maio de 2017. Aparece o primeiro rato do ano na minha casa. Eu acordo de madrugada e Nilcea está fazendo mamá para Júlia. Desesperada, ela diz que tem um camundongo debaixo da pia. Ela ouviu um barulho no pé do varal de chão e viu o roedor correr para debaixo da pia. Nilcea pede para eu pegar alguma coisa para fechar a passagem na cozinha. Eu vou fora de casa e pego um piso grande, o qual coloco na saída da cozinha. Pego um pedaço grande de madeira. E Nilcea começa a tirar uma a uma as panelas debaixo da pia.

Na última panela, sai o bichano correndo para tentar sair da cozinha e esbarra no piso em pé. Tento acertá-lo com o pedaço de madeira, mas não acerto. O pedaço de madeira quebra. O filho da mãe corre para debaixo da geladeira. Eu tento bater com o pau por debaixo da geladeira para ver se ele sai. Nilcea sacode a geladeira e ele sai, tenta subir pelo lado da geladeira, Nilcea acerta um pano nele e o tonteia. Depois pisa no coisa ruim e o mata.

Nilcea leva-o numa pá para fora de casa, coloca o piso em cima e pisa mais para esmagar o nojento. Eu complemento o serviço pegando-o com dois pedaços de madeira e colocando-o dentro de uma sacola plástica no meio da rua e colocando fogo. O cheiro é de matar.

Vamos dormir. Mas e agora? Nilcea diz que podem ter outros camundongos. Eu falo para ela comprar um cola rato, uma nova armadilha industrial. No outro dia, Nilcea compra o cola rato. E não é que a armadilha pega mais um camundongo. Desta vez o serviço foi mais limpo. Preso na cola, conforme técnica que aprendi na internet eu o coloco dentro de um balde d’água e afundo-o com um pano até que ele se afogue. Feito o serviço, coloco-o numa sacola plástica, que Nilcea vai levar pela manhã quando for para o serviço e jogar dentro do valão existente no bairro e de onde provavelmente podem ter surgido esses bichanos.

Mas quem pensa que acabou por aí, está enganado. Não que tenham aparecido outros ratos. Propriamente ditos não. Mas aquelas situações vivenciadas nesses dias me atacaram de certa forma que comecei a ver riscos pretos no chão, como se fossem ratos; a escutar chiados de ratos, até mesmo confundidos com cantos de passarinhos. Tinha absoluta certeza que os ruídos eram de camundongos entrando dando risada na minha casa. Sem contar os pesadelos. Cheguei a sonhar com um rato gigante. Comecei até mesmo a ler sobre ratos. E descobri que o medo de ratos chama-se Musofobia. Mus seria camundongo em latim. Daí podemos concluir também a origem da palavra mouse em inglês.

Wesley Machado

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